quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

## Comportamentos tipo dos cães que são separados temporariamente dos donos .##

Comportamentos tipo dos cães que são separados temporariamente dos donos

Devido às necessidades actuais, têm crescido exponencialmente os hotéis caninos com vista a acolher temporariamente cães de donos que vão de férias ou, por qualquer outro motivo, necessitam de se afastar por um determinado tempo e não podem ser acompanhados pelo seu cão. É de registar, pelo que nos temos dado a perceber, uma intenção dessas instituições de proporcionar um elevado nível de bem-estar do cão de maneira a tentar fazer com que o animal se sinta “como em casa”. Mas muitas dessas intenções são baseadas no estabelecimento de uma analogia connosco próprios, quer dizer, pondo-nos no lugar do cão que está no canil.

Richard Dawkins em 1980 comentava que, “deduzir que um animal sofre enjaulado, porque nós reagiríamos dessa forma numa situação análoga, pode chegar a ser tão absurdo como pensar que um peixe se deveria afogar dentro de água”. Este conceito está tão difundido, que alguns fabricantes de rações preocupam-se em que os seus produtos tenham aromas agradáveis ao olfacto humano.

Quando falamos no castigo através da dor ou submissão, temos que ter em conta que tanto o medo como a dor ou outras formas de sofrimento não ocorrem por azar ou capricho masoquista da natureza, mas que foram produzidas pela Selecção Natural como mecanismos adaptativos e supõem uma vantagem evolutiva tanto para o homem como para o cão.

Por outro lado, a percepção da dor ou sofrimento está associada ao sistema nervoso e os componentes desse sistema é que são muito parecidos em ambas as espécies. Isto torna possível a ideia de que: apesar de não sofrermos pelas mesmas causas, o conceito de dor pode ser similar entre homem e cão.

É nas primeiras horas da estadia do cão no Hotel Canino que, através de observações atentas e conhecedoras, permite avaliar os comportamentos indicadores do seu bem-estar.

Os investigadores apontaram três tipos de comportamento ou categorias metodológicas que podem ser investigadas neste primeiro período de permanência num local estranho e acompanhadas por pessoas estranhas.

1. Modelo de comportamento associado ao GAS


Nalguns cães, o Síndrome Geral de Adaptação (GAS), é acompanhado de erecção dos pelos dorsais, expulsão de fezes e urina, vocalizações específicas, fuga ou agressões. A esta situação é chamada Reacção geral de emergência e, mais que como um indicador fiável de sofrimento, é utilizada para identificar o efeito desencadeador de stress em qualquer das manipulações a que são submetidos pelo tratador.

As reacções gerais de emergência são totalmente desejáveis para a sobrevivência de qualquer espécie. Imaginemos que somos sequestrados e introduzidos local fechado sem podermos comunicar com os nossos familiares. Não podemos, em nenhum momento, pensar que nos encontramos nessa situação por gosto, relaxados e em total acordo com o procedimento utilizado pelos nossos sequestradores. Sem cair no antropomorfismo podemos assegurar que qualquer cão equilibrado mostrará reacções anteriormente descritas. O GAS manifestar-se-á em função da classe hierárquica do indivíduo e o tempo que leva a desaparecer a predisposição do cão para se adaptar à sua nova situação.

2. Comportamentos associados ao medo, conflito ou frustração.

O estudo sobre estes modelos pode ser levado a cabo experimentalmente colocando o animal em situações que provoquem estes estados emocionais:

Presença de um humano com atitudes agressivas = medo
Colocar alimento frente a um modelo agressivo = conflito
Impedir-lhe o acesso a um alimento visível = frustração

Para esta experiência temos que ter em conta que é preferível contar com pessoas do sexo masculino que posteriormente não voltem a ter contacto com o cão. Se observarmos a magnitude dos conflitos descritos durante várias repetições num período não superior a dois dias, teremos um indicador quase fiável daquilo que o cão irá sentir posteriormente.

De realçar que é possível encontrar algumas raças e alguns indivíduos cujos comportamentos associados sejam totalmente dispares quanto à sua exteriorização.

A idade, a experiência do animal, a sua aprendizagem prévia, sexo e raça serão factores de variabilidade na hora de se estabelecer um “padrão próprio de tratamento” que deve ser estabelecido pelo tratador.

3. Comportamentos anormais.


Segundo Fox (1968) “são acções persistentes e não desejáveis que aparecem numa minoria da população, que não são provocadas por nenhum dano do sistema nervoso e que se generalizam para lá da situação que originalmente as provocou”. Normalmente são mal interpretadas como sendo “vícios”. O movimento de sacudir a cabeça, os contínuos passeios com o mesmo trajecto e, inclusivamente, a reiterada tentativa de morder a cauda é uma advertência de que nos encontramos perante um comportamento estereotipado indicador de uma conduta anormal.
Comportamentos estereotipados são um conjunto de movimentos repetidos e relativamente invariáveis que são realizados sem nenhum propósito aparente. A diferença entre um estereótipo indicador de uma conduta anormal e a de uma frustração ou medo, pode ser muito subtil e só um bom especialista pode distinguir se o cão apresenta uma reacção geral de emergência (totalmente desejável para a sua sobrevivência) ou realmente apresenta um comportamento anormal que é necessário corrigir.

Num período de férias em que há muitos cães entregues em hotéis caninos para uma estadia enquanto os donos se ausentam, achámos pertinente publicar este artigo que é fundamentalmente destinado aos responsáveis pelos Hotéis Caninos em geral e aos tratadores em particular.

O que nos motivou a fazê-lo são as nossas observações, em hotéis onde somos consultores, das dificuldades que os tratadores têm em resolver problemas de comunicação e manipulação de alguns cães, principalmente os que são separados dos donos pela primeira vez, com a consequente frustração de ambos. Sabemos que é uma situação pouco conhecida dos donos mas que é um problema altamente preocupante de todos os que estão encarregues de tratar de um “hóspede” a quem não conseguimos “dizer” que está ali temporariamente e que, sendo assim, não foi abandonado pelos “queridos” donos.

30/12/09

Adaptação Genética em Função das Necessidades da Domesticação

O que é que existe na sociedade humana que a torna tão passível de ser explorada? E como é que os cães conseguem fazê-lo? Nós somos, tal como dizia John S. Kennedy, etólogo especialista do comportamento animal, antropomorfizadores “compulsivos”, sempre à procura de comportamentos que mimem, mesmo ao de leve, fenómenos sociais humanos como a lealdade, a traição, a reciprocidade.

A nossa capacidade cognitiva que faz com que atribuamos responsabilidades aos outros é, em parte o que nos torna humanos. Mas isso é realmente compulsivo. Os seres humanos fazem-no de uma forma tão instintiva que estão sempre a atribuir motivos bons ou maus a forças inanimadas como, por exemplo, o tempo.

A nossa esperteza desaparece quando estamos na presença de um mestre como o cão. A nossa tendência é agarrarmo-nos a comportamentos caninos, que afinal são programados, e vermos nesses comportamentos histórias de amor e fidelidade. Muitas vezes, os cães só precisam de ser eles próprios para nos iludirem.

Tomemos como exemplo o “instinto de protecção” em que os donos de cães têm tanto orgulho. Estudos recentemente divulgados concluíram que este foi dos instintos que mais se foi diluindo com a domesticação do cão desde o seu inicio, há 16 000 anos. Os investigadores demonstraram que esta manifestação pretensamente instintiva não tem nada a ver com a lealdade do cão e a suposta preocupação que ele tem por nós. É sim um exemplo daquilo que os psicólogos chamam de “agressão facilitada”. Em vez de sermos protegidos, o cão sente-se protegido por nós e está alerta para qualquer sinal de perigo vindo do exterior.

Pensemos também nas inúmeras histórias que já ouvimos sobre cães que salvaram pessoas. Os cães não têm nenhum instinto especial que os faça salvar pessoas e não entendem que é isso que estão a fazer mesmo quando o fazem. Os cães de busca e salvamento são treinados através da exploração do instinto que têm (esse sim) de cobro ao trazer objectos que lhes são atirados. Os cães são treinados a apanhar e a ir buscar apenas um objecto. Uma vez que conseguem dominar esta tarefa, estão prontos para o passo seguinte: o treinador pega num objecto que o cão goste muito e esconde-se e o cão é encorajado a encontrar o seu brinquedo (motivador). Quando o cão descobre o seu treinador, recebe o brinquedo como recompensa. A repetição frequente deste exercício facilita a consolidação do mesmo.

Isto não retira aos cães o seu fabuloso sentido de olfacto e a capacidade que têm para serem treinados, nem o útil que são em situações desse género. O Que isto significa é que as coisas são mais simples do que nós queremos acreditar. Tal como Gregory Acland salienta, “o que estamos a fazer é isolar um comportamento e a subvertê-lo.” Newfoundlands e outros cães que retiram objectos da água não podem nadar ao lado dos seus donos porque estão sempre a tentar “salvá-los”.

O ponto a que comportamentos complexos semelhantes são geneticamente programados é por vezes assustador. Cadelas grávidas ou em pseudo-gestação tentam frequentemente adoptar um animal de peluche e “tomar conta” dele. Um pássaro cardeal no seu ambiente natural foi observado durante semanas a alimentar peixinhos. Os peixes vinham à tona da água e abriam a boca – como fazem os filhos dos pássaros -, e isto despoleta o comportamento “paternal” da ave.

Uma parte do trabalho de Elaine Ostrander no Projecto sobre o Genoma Canino apresenta uma tentativa em identificar os genes responsáveis por instintos caninos tão complexos como o dos border collies e a sua tendência gregária ou o gosto pela água dos newfoundlands. A terceira geração de cachorros cruzados entre border collies e newfoundlands revelou uma boa mistura dos dois comportamentos – o suficiente para acreditarmos que foram controlados geneticamente. Esta experiência, que envolveu cerca de uma dúzia de genes, prova que precisaríamos de uma centenas de cães para concebermos uma estrutura desses genes.

Melissa Fleming, uma seguidora dos passos de Ostrander, desenvolveu uma análise que permite quantificar certas diferenças de comportamento inatas. Fleming descobriu, que os border collies olhavam fixamente para um carro que funciona por controlo remoto, enquanto o newfoundland não lhe prestava qualquer atenção e só reagia quando o carro vinha na sua direcção.

Outros estudos demonstraram até que ponto é que o comportamento canino é geneticamente definido. Certos tipos de huskies siberianos e de pointers têm uma enorme timidez ou aversão em relação ao ser humano. Quando em contacto com outros cães e mantidos no mesmo canil, os cães tímidos retraem-se (os pointers chegam mesmo a ficar totalmente imóveis quando as pessoas se aproximam), enquanto os outros cães pedem festas. Os criadores conseguiram produzir cães de raça que ladram e outros que não ladram quando sentem o cheiro de uma pista e dálmatas que assumem ou não posições de estátua e acompanham de perto o galope dos cavalos, e até poodles miniatura que nos dão um “passou bem” ou não.

Muito provavelmente o gene da submissão não existe, mas é isso que faz com que o cão saia muitas vezes ileso de situações, inclusivamente de homicídio, na sociedade humana e é inato no comportamento social do lobo. Os cães são animais sociais, tal como nós. A organização social canina consiste numa hierarquia muito rígida em que a submissão a cães superiores e o seu apaziguamento são elementos fundamentais para a sobrevivência. As hierarquias de domínio evitam a violência, mas ela está sempre presente. “É isso que os cães fazem na vida”, diz Gregory Acland, “calculam o comportamento que é esperado deles numa determinada situação e actuam”.

Até os maus treinadores conseguem que os cães façam o que eles querem. Se berrarmos a um cão, ele adula-nos. Será que isto significa que ele se está a desculpar por se ter “descuidado” no tapete persa? A verdade é que isso não interessa ao cão. A adulação é uma técnica de desvio da agressão que o cão domina. Comportamentos como estes são próprios da evolução dos lobos porque são socialmente eficazes. Os cães limitaram-se a afinar estes comportamentos para os poderem aplicar na convivência com o ser humano. Tal como nós somos geneticamente programados para procurarmos sinais de amor e lealdade, os cães são geneticamente programados para explorarem essa nossa fraqueza.

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